terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Os jovens e seus uniformes


Rosely Sayão 
Clipping Educacional - Folha de São Paulo
O professor precisa de muito foco para não se perder na visão da aluna sentada ali com roupas mínimas.
A garota que eu observava deveria ter entre 14 e 16 anos. Bonita como só os jovens dessa idade conseguem ser, vestia shorts mínimos. Mínimos mesmo. E brancos. Usava sandália de salto alto e uma blusa tomara-que-caia.

O garotão que a acompanhava também usava shorts, mas não tão curtos quanto o da garota. A diferença entre a roupa dos dois era a largura da perna da vestimenta. Os shorts da menina eram bem justos. Os do garoto eram bem largos. Largos o suficiente para deixar à mostra a parte mais íntima de seu corpo, quando ele se sentava no chão.
Eles poderiam estar no Carnaval, em um clube, em uma balada. Mas estavam na escola. Isso mesmo: os dois personagens são alunos do ensino médio e estavam no ambiente escolar para assistir às aulas do dia. Não muito longe deles -e no espaço da mesma escola-, crianças pequenas brincavam na areia usando uniforme.
Sabemos que a informalidade é uma marca forte do mundo contemporâneo. Quase todos os rituais sociais foram extintos, a polidez nas relações já não faz o menor sentido, a moda usada no cotidiano não precisa se adaptar ao corpo de quem a usa tampouco à situação ou ao local em que a pessoa está.
O que manda nessas situações todas e em outras semelhantes é o gosto da pessoa, os imperativos do mercado, a erotização infantilizada das relações sociais e do corpo e, finalmente, a busca de visibilidade. "Ver e ser visto" é o que importa, nada mais.
Podemos pensar que o resultado disso tudo é apenas a perda dos bons modos, do recato e das etiquetas, questões lamentadas pelos caretas, pelos mais velhos e saudosistas.
Entretanto, podemos pensar que essa faceta de nosso estilo de viver vai além. Vamos refletir a esse respeito usando o exemplo citado logo no início como um guia de nossos pensamentos.
As roupas usadas pelos jovens caíam muito bem neles; só não caíam bem no local em que estavam. Aliás, para quem não sabe, informo: os professores de ensino médio, principalmente, comentam muito entre si a dificuldade que é dar aulas para a moçada atualmente.
Outro dia mesmo um deles me dizia que precisa de atenção e foco redobrados para dar suas aulas sem se perder na visão das meninas sentadas à sua frente com suas roupas maravilhosamente mínimas. E vale dizer que, no mundo da juventude eterna, diferença de idade alguma faz sentido nessa questão.
Os professores sabem que isso não está certo e a escola reclama das roupas que as mães deixam suas filhas vestirem para frequentar as aulas, mas ninguém faz nada.
Por exemplo: por que as crianças pequenas devem usar uniforme na maioria das escolas e os adolescentes, não? Receio que essa pergunta fique sem uma boa resposta por parte das escolas.
Mas o bordão da "educação para a cidadania" vale para todas elas, certamente. O problema é que ninguém vê -ou não quer ver- a ligação entre os dois assuntos.
Os jovens são os mais vulneráveis às pressões do mercado da aparência, das etiquetas (de marca) e das tendências adotadas por seus pares porque eles ainda não têm senso crítico. Estão na escola justamente para adquirir ou sofisticar esse tipo de análise.
Por que não fazemos nada além de observar, criticar sussurrando ou furtivamente? Talvez porque nós mesmos estejamos enredados nesse problema.
Enquanto isso, está cada vez mais difícil identificar, nos locais de trabalho, quem lá está a exercer sua profissão e quem está lá em busca de um profissional.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)

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