domingo, 3 de abril de 2011

Critérios para concorrer a bônus na USP pioraram

Clipping Educacional - iG São Paulo
Mudanças no programa de inclusão dão a falsa impressão de que alunos receberão empurrão para se empenharem no ensino médio
Na capa dos jornais, nos links dos sites, nas chamadas das rádios e nas manchetes da TV, a notícia realmente parece muito boa. Fora raras exceções, os títulos da imprensa dão a impressão de que a USP passará a ser inclusiva e que seu programa para alunos oriundos de escolas públicas vai oferecer, fartamente, um super empurrão para alunos carentes que se empenharem em seus estudos no ensino médio.
Isso não é verdade. Os 15% de bônus anunciados pela universidade são o teto que um aluno pode atingir. Dificilmente alguém chegará a perceber esse abono em sua nota. A grande maioria dos alunos de escolas públicas, mesmo os mais dedicados, não consegue resolver metade da prova da Fuvest. Para que fique claro, resolver metade da prova da Fuvest é uma tarefa extremamente difícil, principalmente após as alterações inseridas nos últimos anos.
Neste caso, remoto, de resolver metade da prova, o aluno terá menos de 10% de acréscimo à nota que obteve na prova de primeira fase. Isso só é suficiente para o aluno passar da nota 45 para a nota 49, o que o deixa ainda a uma longa distância de ir para a segunda fase do vestibular nos cursos mais tradicionais e concorridos da instituição, como medicina (70), engenharia (58) e direito (56), nos quais é quase impossível entrar sem ter frequentado algumas poucas escolas particulares.
Os critérios para concorrer ao bônus conseguem ser piores que os anteriores. Quem estiver no segundo ano do ensino médio e fizer o vestibular nesse período poderá concorrer a até 5% de acréscimo na nota. É demais esperar que alunos com cerca de 16 anos, de escolas públicas, irão fazer, já no segundo ano, uma prova de uma instituição que acham que nunca terão acesso. Mesmo que queiram, vale lembrar que a Fuvest só aplica a prova em 22 cidades de São Paulo, apesar de o Estado ter 75 cidades com mais de 100 mil habitantes. No total, são 645 cidades, e mais de 600 sem aplicação da prova da Fuvest.
O resultado é que serão poucos os estudantes de escolas públicas de São Paulo que farão a Fuvest um ano antes de terminar o ensino médio. E, quem fizer, pode ter uma experiência que assuste e faça com que não queira mais ver a prova. No vestibular de 2010, que mostrou claramente que a Fuvest está muito mais difícil agora do que sempre foi, quase metade das carreiras tiveram nota de corte igual ou inferior a 36 pontos, que é o equivalente a acertar 40% ou menos das questões. Imagine um aluno do segundo ano, de escola pública, fazendo uma prova em que até boa parte dos alunos que conseguem chegar à segunda fase tiram nota inferior a 4. Será mesmo que ele irá encarar, de novo, a prova no outro ano?
Quem fizer a prova no terceiro ano poderá chegar a um abono de até 10% em sua nota. Tudo isso, mesmo que desse certo, poderia, no máximo, ajudar entre 300 e 500 alunos, que ficam na rabeira da aprovação nos cursos menos concorridos da universidade, beneficiados no vestibular. O programa atual já faz isso, mas é muito pouco para um Estado como São Paulo e para uma universidade como a USP.
Se a instituição quer incluir, de fato, e parar de jogar para a plateia, deve fazer duas coisas. A primeira é aumentar o número de vagas, vinculando-as ao aumento de seu orçamento. Como a USP, assim como as demais faculdades estaduais de São Paulo, tem seu orçamento vinculado à arrecadação de ICMS, de 2003 a 2011 registrou um aumento em suas receitas anuais de 150%. Em 2003, a USP oferecia 8,5 mil vagas. Se as vagas estivessem aumentando na mesma proporção do orçamento, considerando só esse período, hoje teríamos quase 22 mil vagas na universidade. Como não existe essa preocupação, só existem 10.652 vagas. E, ainda pior, sob a ameaça de vagas serem cortadas na USP Leste e em várias outras unidades da universidade.
A segunda necessidade, extremamente urgente, é implantar cotas para alunos oriundos de escolas públicas. No último vestibular, somente 25% dos alunos aprovados vieram da rede pública. E isso é uma média, porque em medicina e direito, por exemplo, quem é negro, pobre e de escola pública, em geral, não sabe nem onde ficam as respectivas unidades. A implantação de cotas não fere em nada a tão propagada meritocracia, cantada em verso e prosa pela reitoria. Cota não universalizaria o acesso à USP, opção tratada com ojeriza pela direção. Só daria acesso aos alunos de escolas públicas que mais acertam questões nos vestibulares, do jeitinho que o reitor gosta. E todas as pesquisas mostram, claramente, que os alunos aprovados por cota tendem a ter aproveitamento igual ou melhor que os não-cotistas em sua passagem pela universidade.

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