GERALDO TADEU MONTEIRO
Clipping Educacional – O Globo
Certa vez, Nabucodonosor, rei da Babilônia, teve um pesadelo em que uma enorme estátua desmanchava-se em pedaços ao ser atingida, nos pés, por um pequenina pedra. Coube ao profeta Daniel explicar o sentido daquele sonho: a cabeça da estátua era de ouro, o peito e os braços de prata, as coxas de bronze, mas os pés, de barro. Depois daquele reino de ouro, prossegue o profeta, virá outro, de prata, seguido por outro, de bronze, até que o último, de barro, pereceria. (Daniel, 1, 31-44). Esta alegoria bíblica serve perfeitamente para ilustrar as conclusões do último Relatório de Desenvolvimento Humano que colocou o Brasil na nada honrosa 73ª posição no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano.
O novo IDH procura retratar melhor os progressos obtidos em cada área. Por isso, abandona as medidas binárias (alfabetizados x não alfabetizados) em favor de medidas de gradação. A nova metodologia corrige ainda o risco da substituibilidade entre as dimensões, ou seja, avanços em uma área podiam mascarar atrasos em outras. Por sua abrangência e confiabilidade, o IDH é hoje o principal índice de avaliação da qualidade de vida no mundo, o que deveria levar as autoridades de todos os países a se debruçar sobre seus resultados para elaborar estratégias de superação das lacunas que ele aponta. No caso brasileiro, elas ficam evidentes quando se fala de Educação.
Na economia, o Brasil apresenta-se como gigante: 8ª maior economia do planeta, 5º mercado mundial em telefonia celular, 5º em número de usuários da internet, 7º maior credor em reservas internacionais e 10º produtor mundial de energia elétrica. Na Educação, no entanto, ao compararmos nossos índices aos de outros países, mostramos nossos pés de barro. De acordo com o PISA 2006 (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), entre 57 países avaliados, fomos 52º em ciências, 54º em matemática e 50º em leitura. Segundo a ONU, o Brasil tem ainda cerca de 10% de analfabetos (são 2,3% na Argentina), só 21,9% têm alguma educação pós-secundária (no Uruguai são 44,6%) e apenas 30% têm acesso ao ensino superior (no Panamá são 45%). Na avaliação da eficiência do sistema escolar, as discrepâncias são ainda maiores: as taxas de abandono escolar giram em torno de 24% (5,1% no Chile) e os índices de repetência no ensino fundamental vão a 18,7% (no Peru, são 7,2%). Enquanto no Brasil há em média 23 alunos para cada professor, na Argentina são 14,8. Professor cujo rendimento médio é de cerca de 44% do rendimento do professor europeu. Se o Brasil é 73º no IDH geral, no IDH-Educação caímos para o 93º lugar, atrás de Quirguistão (71º), Botswana (81º) e Guiana (85º). No quesito Educação, somos ainda Terceiro Mundo.
E, paradoxalmente, essa situação calamitosa não resulta de falta de recursos: gastamos cerca de 5,2% do PIB com Educação, mais que a Austrália (4,7%) e que a Alemanha (4,4%), respectivamente segunda e décima colocadas no IDH. Segundo a OCDE, o Brasil destina à Educação cerca de 16% do total da despesa pública, taxa maior que a média da União Europeia (12,1%). Os recursos, no entanto, são mal aplicados: gastamos com ensino superior proporcionalmente mais que a Itália e o Japão e, na Educação básica, destinamos ao pagamento de professores 73% dos recursos públicos, menos que o Chile (89,2%) e o México (92,2%). A partir desses dados, a discussão sobre o aumento da despesa com Educação para 7% do PIB deixa de ser central; aqui, a prioridade é fazer mais com o que já temos.
Não se trata de negar os avanços que o país obteve também na Educação, como ter colocado 98% das crianças na escola, mas é preciso encarar a realidade: nosso desafio é a qualidade da Educação. A implantação do Sistema Nacional de Educação, envolvendo o governo federal, estados e municípios, do Piso Nacional dos Professores e dos Planos de Carreira Docente é tarefa urgente. A falta de uma verdadeira política nacional de Educação, com ênfase no ensino básico, já ameaça o futuro do país na Era do Conhecimento. Como ocorreu com o reino da Babilônia.
GERALDO TADEU MONTEIRO é cientista político.
Fonte: http://oglobo.globo.com
Certa vez, Nabucodonosor, rei da Babilônia, teve um pesadelo em que uma enorme estátua desmanchava-se em pedaços ao ser atingida, nos pés, por um pequenina pedra. Coube ao profeta Daniel explicar o sentido daquele sonho: a cabeça da estátua era de ouro, o peito e os braços de prata, as coxas de bronze, mas os pés, de barro. Depois daquele reino de ouro, prossegue o profeta, virá outro, de prata, seguido por outro, de bronze, até que o último, de barro, pereceria. (Daniel, 1, 31-44). Esta alegoria bíblica serve perfeitamente para ilustrar as conclusões do último Relatório de Desenvolvimento Humano que colocou o Brasil na nada honrosa 73ª posição no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano.
O novo IDH procura retratar melhor os progressos obtidos em cada área. Por isso, abandona as medidas binárias (alfabetizados x não alfabetizados) em favor de medidas de gradação. A nova metodologia corrige ainda o risco da substituibilidade entre as dimensões, ou seja, avanços em uma área podiam mascarar atrasos em outras. Por sua abrangência e confiabilidade, o IDH é hoje o principal índice de avaliação da qualidade de vida no mundo, o que deveria levar as autoridades de todos os países a se debruçar sobre seus resultados para elaborar estratégias de superação das lacunas que ele aponta. No caso brasileiro, elas ficam evidentes quando se fala de Educação.
Na economia, o Brasil apresenta-se como gigante: 8ª maior economia do planeta, 5º mercado mundial em telefonia celular, 5º em número de usuários da internet, 7º maior credor em reservas internacionais e 10º produtor mundial de energia elétrica. Na Educação, no entanto, ao compararmos nossos índices aos de outros países, mostramos nossos pés de barro. De acordo com o PISA 2006 (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), entre 57 países avaliados, fomos 52º em ciências, 54º em matemática e 50º em leitura. Segundo a ONU, o Brasil tem ainda cerca de 10% de analfabetos (são 2,3% na Argentina), só 21,9% têm alguma educação pós-secundária (no Uruguai são 44,6%) e apenas 30% têm acesso ao ensino superior (no Panamá são 45%). Na avaliação da eficiência do sistema escolar, as discrepâncias são ainda maiores: as taxas de abandono escolar giram em torno de 24% (5,1% no Chile) e os índices de repetência no ensino fundamental vão a 18,7% (no Peru, são 7,2%). Enquanto no Brasil há em média 23 alunos para cada professor, na Argentina são 14,8. Professor cujo rendimento médio é de cerca de 44% do rendimento do professor europeu. Se o Brasil é 73º no IDH geral, no IDH-Educação caímos para o 93º lugar, atrás de Quirguistão (71º), Botswana (81º) e Guiana (85º). No quesito Educação, somos ainda Terceiro Mundo.
E, paradoxalmente, essa situação calamitosa não resulta de falta de recursos: gastamos cerca de 5,2% do PIB com Educação, mais que a Austrália (4,7%) e que a Alemanha (4,4%), respectivamente segunda e décima colocadas no IDH. Segundo a OCDE, o Brasil destina à Educação cerca de 16% do total da despesa pública, taxa maior que a média da União Europeia (12,1%). Os recursos, no entanto, são mal aplicados: gastamos com ensino superior proporcionalmente mais que a Itália e o Japão e, na Educação básica, destinamos ao pagamento de professores 73% dos recursos públicos, menos que o Chile (89,2%) e o México (92,2%). A partir desses dados, a discussão sobre o aumento da despesa com Educação para 7% do PIB deixa de ser central; aqui, a prioridade é fazer mais com o que já temos.
Não se trata de negar os avanços que o país obteve também na Educação, como ter colocado 98% das crianças na escola, mas é preciso encarar a realidade: nosso desafio é a qualidade da Educação. A implantação do Sistema Nacional de Educação, envolvendo o governo federal, estados e municípios, do Piso Nacional dos Professores e dos Planos de Carreira Docente é tarefa urgente. A falta de uma verdadeira política nacional de Educação, com ênfase no ensino básico, já ameaça o futuro do país na Era do Conhecimento. Como ocorreu com o reino da Babilônia.
GERALDO TADEU MONTEIRO é cientista político.
Fonte: http://oglobo.globo.com
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