quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O fiasco do Enem

Clipping Educacional - Estadão on line - Versão impressa
As dificuldades enfrentadas pelos candidatos para se inscrever pela internet no Sistema de Seleção Unificada, com o objetivo de usar as notas obtidas no Enem para garantir matrícula na rede pública de ensino superior, constituem mais uma demonstração de incompetência da burocracia do Ministério da Educação (MEC) e das confusões causadas pela tentativa do ministro Fernando Haddad de converter a reforma dos mecanismos de avaliação em bandeira política, com vistas às eleições deste ano.
As autoridades educacionais alegaram que o sistema de informática do MEC não suportou a sobrecarga de tentativas de acesso, a partir da noite de sexta-feira. Por ironia, esse foi o mesmo argumento que elas invocaram no início do segundo semestre de 2009, quando o órgão decidiu que a inscrição no Enem e a utilização das notas para substituir o exame vestibular seriam feitas pela internet. Mais de seis meses após o aparecimento do problema, fica evidente que o MEC ainda não conseguiu equacioná-lo. Em outras palavras, ele tentou reformular radicalmente o sistema de avaliação do ensino médio sem, como agora se vê, ter infraestrutura capaz de dar conta da empreitada.
Além dos problemas de informática, o MEC fracassou ao planejar as provas. Isso ficou evidente quando o órgão determinou que vários estudantes deveriam prestar o Enem em colégios situados a mais de 300 quilômetros das escolas em que estão matriculados, o que deixou pais e professores revoltados com tanta inépcia administrativa. Em seguida, a prova vazou dois dias antes de sua realização, em outubro, deixando claro que as autoridades educacionais também não haviam tomado as medidas de segurança necessárias. Isso as obrigou a preparar um novo teste às pressas, a um custo superior a R$ 30 milhões, e a aplicá-lo dois meses após a data prevista, o que desorganizou o calendário de muitas universidades.
Na sequência de confusões, constatou-se em seguida que várias questões da nova prova tinham nítido viés político e ideológico, tendo de ser anuladas. No dia em que a prova foi finalmente realizada, o MEC chegou ao absurdo de divulgar o gabarito errado. E agora, além de reclamar das dificuldades que estão enfrentando para acessar o site das universidades federais, os alunos relatam graves falhas na correção das provas do Enem ? a ponto de um estudante que fez uma redação de apenas quatro linhas ter tirado boa nota.
Pelos planos do MEC, o novo formato do Enem foi concebido como principal critério de distribuição de 47,9 mil vagas em 51 instituições públicas de ensino superior. Mas, embora a medida tenha sido bem recebida nos meios escolares, por causa de interesses políticos ela acabou sendo implementada de modo açodado e desastrado ? o que converteu o Enem num enorme fiasco. Por causa das sucessivas confusões do MEC, a prova teve uma abstenção de quase 40% dos inscritos ? a maior já registrada desde sua criação, em 1998.
Esse fiasco é o retrato do governo Lula no campo da educação. Seu governo já teve sete anos para tentar melhorar a qualidade da educação fundamental e média. Mas, em vez de fazer o que os especialistas recomendavam nesses dois níveis de ensino, as autoridades educacionais se contentaram em agitar bandeiras mais vistosas do que eficazes. No primeiro mandato de Lula, por exemplo, perderam-se tempo e recursos com promessas de democratização do ensino superior e projetos de expansão das universidades federais, sem cuidar seriamente da formação básica e de fortalecer o ensino médio ? onde estão os principais gargalos do sistema educacional. No segundo mandato, ao tentar promover reformas nos mecanismos de avaliação herdados do governo anterior, cometeram tantos equívocos que acabaram pondo em risco a própria credibilidade do sistema.
É por isso que, apesar de o País ter conseguido universalizar o acesso ao ensino fundamental, na década passada, a educação brasileira continua sendo reprovada nos levantamentos comparativos dos organismos multilaterais e os estudantes continuam tendo um desempenho medíocre nos testes internacionais de avaliação do conhecimento.
fonte: http://www.estadao.com.br

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