Clipping Educacional - Da Agência USP de Notícias
Os jovens da periferia aplicam seu escasso dinheiro, principalmente, em cuidados com a aparência. A escolha é uma tentativa de fugir do preconceito que sofre e ser aceito pelo seu grupo social e sociedade. Esse é o tema que a cientista social Paula Nascimento da Silva desenvolveu no seu mestrado, concluído em 2008 na Faculdade de Educação (FE) daUniversidade de São Paulo (USP).
Paula estudou o Grupo de Assistência Social Bom Caminho, na periferia da zonao este de São Paulo. A instituição integra cerca de 160 jovens da comunidade e aborda temas como educação, família, saúde,violência e outros. Atuou no Bom Caminho como voluntária durante quatro anos, nos quais realizou atividades sociais, entrevistas e questionários sobre consumo e assuntos relacionados aos jovens de 13 a 21 anos.
A ideia da pesquisa é identificar os bens de consumo privilegiados por eles e o porquê.
Pelas entrevistas, Paula constatou que preferem vestuário e objetos que compõem a aparência pessoal, como tênis, roupas, produtos de cabelo, cosméticos e outros. Numa das perguntas aos adolescentes sobre o que fariam se tivessem R$ 500,00, entre as respostas apareceram ajudar a família, as contas da casa ou comprar alimentos, mas predominaram gastos com aparência. Homicídio – Diferentemente do jovemde classe média e alta, sem dificuldades para conseguir emprego ou estágio, o moradorda periferia em geral trabalha informalmente e a maioria faz bico eventual. Com o tráfico e outras atividades ilegais (sempre mais presentes que em outros grupos sociais), ele pode ganhar mais dinheiro em menos tempo.“Questionei por que esse jovem arrisca a vida para ganhar dinheiro e gastar com supérfluos,como tênis de marca, roupa, festa e balada”.
A resposta é que ele é estigmatizado como marginal, que não trabalha. Paula diz que existe forte preconceito da sociedade, mas se ignora que esse jovem é muito mais vitimizado que as pessoas de outros setores e faixas etárias da sociedade. Por exemplo, no Brasil, a taxa de homicídio violento é de 48 casos para cada mil mortes na população geral. Na periferia de São Paulo, entre os rapazes, o índice sobe para 106.
A pesquisa de campo mostrou quequando o jovem sai da periferia é discriminado.“Exemplo: quando vai ao shopping, o segurança o aborda e pergunta o que faz ali”, explica. “Percebi que o consumo está diretamente ligado ao preconceito”. A tentativade mudar a aparência é uma maneira de fugir do estigma negativo que existe em relação ao jovem da periferia.
Consumismo – A pesquisa indica que vestuário e aparência não são gastos supérfluos para o jovem da periferia, muito pelo contrário.“Como ele é excluído da sociedade, vive sem segurança, saúde e educação. E a possibilidadede construir um futuro está distante. O consumo ligado à aparência traz resultado rápido e evidente”, informa a cientista. Para fugir do estereótipo e ser aceito no próprio grupo, deixa de investir na formação e gasta com produtos para aparentar algo que a sociedade aceita e valoriza. Como o jovem dos 13 aos 21 anos é frágil e necessita de reconhecimento e aceitação, Paula diz que ele investe no consumismo. Para ela, o poder público precisa conscientizar o jovem a usar seus poucos recursos em algo mais necessário e construtivo, como melhores condições de educação, saúde, alimentação e moradia.
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